domingo, março 20, 2011

Geração à rasca

Nas manifestações de rua da auto-denominada "geração à rasca", ouvimos entrevistas de rua em que muitos dos entrevistados não só tinham a licenciatura mas tinham doutoramento e não arranjavam emprego. A manifestação que envolveu mais de cem mil pessoas, é um grito de revolta. No entanto fica também a ideia que o governo é responsável e poderá resolver-lhes a vida. Infelizmente o governo não pode dar emprego a quase ninguém por ter decidido congelar as contratações para a Função Pública, ao invés, continua a dispensar pessoal da Função Publica, seja por reformas antecipadas seja por outros meios. Quem pode empregar obviamente são as empresas. Mas as empresas e os empresários são um alvo difícil de identificar e não é popular culparem a falta de inovação e crescimento das empresa nos empresários. Os empresários, deviam por exemplo ser obrigados a contratarem x licenciados, y mestres e até alguns doutores, dependendo da sua dimensão, e não se permitir que lucrem com base em salários baixos de trabalhadores indiferenciados. Quem pode exigir? O governo. E a que empresas? Às que recebem subsídios do governo obviamente. Mas como este tipo de ideias é demasiado arrojado para qualquer governo, é melhor esquecer.
A ingenuidade da juventude e o desespero leva-os a culparem o óbvio e mais distante, e a não analisarem aqueles com quem mais de perto conviveram durante as sua vida de estudante: os seus pais e os seus professores e os que lhes concederam as bolsas para estudarem e os lugares para investigarem. Infelizmente os pais com as melhores das intenções, muitas vezes cederam à ambição de terem filhos doutores, não interessava muito em quê, desde que pudessem dizer à família, vizinhos e colegas que os filhos eram doutores. Muitas destas famílias viviam, e vivem, com dificuldades e trabalharam uma vida inteira para que não faltasse aos filhos o que lhes faltou a eles e em contrapartida os jovens esforçam-se e entram no Ensino Superior ou mediante um sistema de facilitismo, mesmo sem esforço entram para as Universidades, Politécnicos ou Institutos. No pico desta enchente até entravam com notas negativas. Agora entram com notas positivas mas inflacionadas porque as estatisticas assim o exigem. Assim muitos avançam pelos cursos. Os melhores continuam para mestrados, doutoramentos e pós-doutoramentos, candidatando-se a bolsas de Universidades e Institutos que muitas vezes são até reconhecidos como excelentes. O problema é que estes institutos funcionam em circuito fechado. Alimentam-se dos trabalhos dos estudantes para com esse trabalho científico terem verbas para sobreviverem e até crescerem. Não há dúvida que alguns produzem trabalho científico de qualidade com estes bolseiros, e que é divulgado e até pavoneado pelos seus superiores nos media. Mas uma vez acabada a bolsa são descartados e os seus superiores continuam com outros bolseiros na mesma senda do auto elogio e do percurso mediático que alimenta o seu ego. Estes empregadores que pagam bolsas e recibos verdes deviam, a meu ver, ser honestos para com os candidatos e avisarem-nos que uma bolsa de pós-doutoramento, e mesmo de doutoramento, não dá emprego, pelo contrário só dificulta.
A outra frase muito vulgar nas entrevistas e já gasta é a de emigrarem para outro País onde as probabilidades de emprego são melhores. Mais uma falácia. Países onde as probabilidades são melhores, tais como os Estados unidos, também são os Países onde há mais concorrência. Há milhares de indianos e chineses com excelentes currículos a candidatarem-se a esses lugares. Mas mesmo que se consiga um bom lugar permanente numa Universidade ou mesmo numa grande empresa, não é a mesma coisa (anúncio da zon…podia mas não era a mesma coisa). Fica a família para trás, ficam os amigos. Por outro lado, os jovens com boas qualificações que foram formados em Portugal têm uma dívida para com o País. Gastou-se dinheiro, criaram-se expectativas para o País, reveladas em estatísticas emanadas constantemente pelo Ministério de Mariano Gago, em nº de doutoramentos obtidos (sempre a crescer). Seria interessante se o Ministério fizesse um apanhado sobre o percurso desses doutorados nos anos subsequentes ao doutoramento! Talvez fosse menos triunfalista em relação a estes números!
Há males que vêm por bem. Talvez a crise nas finanças dos ministérios, inclua o abrandamento neste frenesim e nesta corrida sem fim á vista.
Financiar estágios remunerados acompanhados pelas Universidades em vez de bolsas seria um começo. E não só mil estágios como já o fizeram nos dois últimos anos. Vinte, trinta, quarenta mil, gastando tanto como têm gasto com os Institutos de investigação em actividades que muitas vezes são notícia mas não dão emprego a ninguém!